Boa noite querido leitor (a)!
O assunto que me traz por aqui
hoje, talvez mais de um ano após a última postagem é o da importância de ver a
vida como um filme. É algo que considero essencial para ter uma vida o mais
tranquila e relaxada possível. Tranquilidade e relaxamento parecem-me estados
interiores que tornam a experiência de viver bem agradável (pelo menos, assim
penso). E parece-me também que esse estado de tranquilidade e relaxamento se
tornam bem difíceis se cometermos o «erro» de nos identificarmos com as
diferentes circunstâncias que vão ocorrendo ao longo do dia, sendo que muitas
delas são tudo menos agradáveis.
Por exemplo: pensemos numa circunstância
em que víamos um filme. Nesse filme, muita coisa ocorre, agradável ou
desagradável. Se cometermos o erro de nos identificarmos com as diferentes
circunstâncias do filme, essa identificação vai levar-nos para diferentes estados
emocionais, mais ou menos agradáveis, de acordo com o teor dos acontecimentos.
No entanto, se ao longo do filme, pudermos manter plena consciência de que
aquilo que se passa nada tem a ver connosco, deixa de haver qualquer razão para
que esse tipo de oscilação emocional (geradora de intranquilidade) ocorra.
Mantemo-nos como meros espectadores, desidentificados e não-judicativos.
A meu ver, este mesmo espírito
pode (e deve) ser transportado para a vida de todos os dias. Ao caminharmos, ao
estarmos relaxadamente sentados, ao andarmos de autocarro, ao andar de comboio,
ao estarmos na praia, ao darmos um passeio pela cidade, seja onde for e seja a
fazer o que for, podemos adoptar esta postura de observadores interessados do
filme da vida. No filme da vida podemos ser simultaneamente personagens,
observadores e realizadores, consoante a nossa vontade e conveniência. No filme
da vida existem múltiplas personagens, situações e contextos. E, da mesma
maneira que nos é possível, ao estarmos a ver televisão, mudar de canal quando
o que é transmitido não nos agrada, na vida podemos também transferir o foco da
nossa atenção de coisas que não nos agradam para outras que nos agradem mais (de
acordo com a amplitude da nossa consciência acerca do que nos agrada mais e do
que nos agrada menos).
Esta última ideia, prende-se com
a questão do livre-arbítrio. Em cada momento e situação temos uma determinada
amplitude de apreensão e captação da realidade. Imaginemos uma situação em que
vamos dentro de um comboio, deslocando-nos para determinada localidade. Nesse
contexto, estamos expostos a vária quantidade de estímulos: a paisagem que
vislumbramos de fora da janela, a conversa das pessoas do lado, o mau cheiro da
pessoa que vai do meu lado, a mulher
bonita do assento da frente, o revisor que chega para picar o bilhete, o
comboio de alta velocidade que passa em sentido contrário, enfim, vários
exemplos poderiam ser dados. E garantidamente que nenhum desses estímulos tem
absolutamente nada a ver connosco. Situados naquele contexto, esses estímulos
surgem independentemente da nossa vontade. E podemos ver qualquer desses
estímulos que surgem como se de diferentes canais de televisão se tratassem.
Quando não gostamos do programa, mudamos de canal, para encontrar um que nos
agrade mais. Da mesma maneira que, no exemplo do comboio, temos o
livre-arbítrio de mudar de assento se não gostamos da pessoa que vai ao nosso
lado, de olhar para fora da janela, se a pessoa que vai na nossa frente for
demasiado feia, de ouvir música caso se verifiquem conversas desagradáveis ao
nosso redor, de dizer ao revisor que ele já picou o nosso bilhete anteriormente
(e nos encontrarmos sem bilhete, eheh) ou, em último caso, sair numa qualquer
estação intermédia, caso o ambiente vivido dentro do comboio seja algo de
insuportável. Por outras palavras, mudando o foco da nossa atenção, mudamos
também a nossa realidade. Mudando a nossa realidade, mudamos o estado interior.
Mudando o estado interior, modificamos a nossa qualidade de vida, tornando-a
mais agradável.
Para conseguir esta mudança,
convém, por fim, diferenciar dois conceitos, já diferenciados de forma
implícita ao longo do que temos vindo a debater. Esses dois conceitos são o
contexto e o conteúdo. O contexto, seria o estar dentro de um comboio,
correspondente a uma circunstância permanente. O conteúdo seria composto por
todos os estímulos existentes dentro do comboio, correspondentes a
circunstâncias transitórias. Estar consciente do contexto permite atrelar a
nossa consciência a algo de permanente, produzindo paz e tranquilidade. Por outro
lado, focar a nossa consciência no conteúdo implica atrelá-la a circunstâncias
transitórias, instáveis e impermanentes, produzindo intranquilidade (por se
acreditar que os acontecimentos desagradáveis vão durar muito ou que os
acontecimentos agradáveis vão durar pouco). Esta diferenciação é vital, uma vez
que é muito fácil cair no erro de focar a consciência nos diferentes conteúdos
da vida o que, fatalmente, produzirá estados interiores desagradáveis. O
segredo reside na capacidade de desfrutar desapaixonadamente dos diferentes
conteúdos, mantendo sempre o contexto debaixo de olho.
Uma forma de conseguir incorporar
esta filosofia de vida é através da prática de uma técnica chamada de
contemplação, que será tema de um próximo post.
Forte abraço!
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